segunda-feira, 22 de março de 2010

CAÇADOR DE AVENTURAS

José Fernandes Franco aceitou um desafio: criar o turismo ecológico adaptado para deficientes físicos, com direito à tirolesa e outras modalidades radicais. E não é que deu certo?
ver original http://www.revistasentidos.com.br/inclusao-social/54/artigo152076-4.asp
Por Katia Deutner






"Eu contei com profissionais especializados para treinar meus funcionários a lidar com os deficientes."
RS: Como passou para a hospedagem?
JF: Começou a dar muito certo, passamos a receber mais de cem ônibus por ano com visitas de escolas. O crescimento e a demanda forçaram-me a criar uma área de hospedagem. O Hotel Fazenda Campo dos Sonhos foi inaugurado em 1 de abril de 1994, dia do aniversário de minha mãe, Maria Fernandes Franco. Nesta época, não tinha noção que ia me deparar com questões de acessibilidade, até que apareceram escolas com pessoas com Síndrome de Down e o Hospital Cristália começou a trazer deficientes intelectuais para o hotel.
RS: Foi então que resolveu fazer o turismo de aventura acessível?
JF: Já tinha algumas programações para o pessoal da terceira idade, que tem mobilidade reduzida. Mas foi durante a Adventure Fair, em 2005, em uma reunião com o Ministério do Turismo que tudo começou. Eles buscavam parceiros para ajudar na implementação de uma lei para adaptação do turismo de aventura. Precisavam de um empresário com estrutura física e uma ONG, pois assim poderiam elaborar um projeto e criar condições para a prática das atividades de aventura por deficientes. Foi então que contei com a ajuda de Dadá Moreira, da ONG Aventura Especial. Aventureiro, Dadá sofre de ataxia, um problema neurológico que afeta o equilíbrio, a coordenação motora fina, a fala e a visão. Sua experiência mostrou que, ao praticar esportes mais radicais, sua doença não progredia.
RS: Quais foram as dificuldades no início do projeto?
JF: Não imaginava que fazer adaptação fosse muito além de fazer reformas em banheiros e portas. Eu precisava de carrinhos elétricos para a locomoção do pessoal. Tive que estudar rotas alternativas do restaurante para cada chalé. Por sorte, já tinha colocado portas mais largas, mas precisei adaptar camas para seguir o padrão recomendado de altura. Foram surgindo dúvidas. Por exemplo, como um tetraplégico consegue descer em uma tirolesa? Eu contei com a ajuda de profissionais especializados para treinar meus funcionários a lidar com os deficientes.
RS: E os primeiros testes?
JF: Contei com a ajuda de voluntários com Síndrome de Down, ataxia, paralisia cerebral, tetraplégicos, paraplégicos, amputados, surdos, surdo-cegos. Acabamos ficando com 10 modalidades: cavalgada, tirolesa, arvorismo, rapel, rafting, boia-cross, acqua ride, off-road, trekking e canoagem. Estudamos outras atividades, mas não apresentaram condições para a prática. Para cada um deles, usamos uma simbologia que indica se pode ser feita ou não e se precisa de adequação mínima ou moderada para cada tipo de deficiência.
RS: Precisou fazer muitas adaptações?
JF: Criamos cadeiras especiais para rafting e uma série de outras. O colete salva-vidas, por exemplo, boia e deixa a pessoa de barriga para baixo. Para um tetraplégico isso pode significar um afogamento se demorarmos para prestar socorro. Pedimos então para um fabricante desenvolver um modelo que faz a pessoa ficar de barriga para cima, boiando, enquanto espera a ajuda.
RS: Ainda virão outras modalidades?
JF: Começamos uma segunda fase do projeto com atividades que não entraram, como as aquáticas, com mergulho, e outras de ar, como parapente e asa delta. Temos agora a parceria da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura (ABETA) e o respaldo da AVAPE. O projeto está sendo detalhado e já recebemos uma proposta de verba do Ministério do Turismo. Os testes devem começar até o final deste ano.
RS: Não foram somente os deficientes que ganharam, não é?
JF: Sim, a cidade de Socorro virou referência em acessibilidade no turismo e está adaptando vários pontos para receber bem os visitantes com deficiência. Mas ainda não acabamos a implantação do projeto Socorro Acessível.
RS: E todo esse investimento trouxe retorno?
JF: Eu pensei que este era um projeto social e que ia abdicar da parte financeira. Só que foi muito mais viável economicamente. O investimento todo já foi pago e sobrou. Poucos são os hotéis adaptados no país. Desde novembro do ano passado o hotel está lotado. E os deficientes vêm com a família para fazerem atividades juntos.
RS: Quantas pessoas trabalham nas empresas?
JF: Tenho 123 funcionários todos registrados. São 73 no Campo dos Sonhos e 50 no Hotel Aventura Parque dos Sonhos [parte do complexo de aventura], sendo dois deficientes. Tenho dificuldade em contratar mais pessoas deficientes porque a cidade é pequena
RS: E o retorno emocional?
JF: Não tenho palavras para descrever o que sinto ao ver a alegria destas pessoas ao conseguirem fazer coisas que não imaginavam. Um tetraplégico descendo de tirolesa é muito emocionante. Sofri uma mudança grande em minha vida e participei de algo inédito com um resultado humanitário. Com certeza, quero continuar a fazer mais por este público.
RS: Teve alguma situação ruim?
JF: Eu me decepcionei com hóspedes que rejeitaram a convivência com os deficientes. São pessoas que não estão preparadas para a inclusão. Felizmente, são raros estes casos


Onde encontrar

Hotel Fazenda Campo dos Sonhos
(19) 3895-3161
http://www.campodossonhos.com.br/
Hotel Aventura Parque dos Sonhos
(19) 3955-2870
http://www.parquedossonhos.com.br/

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